sábado, 4 de fevereiro de 2012

Capítulo 07 - Culpa, medo e seus motivos


Uma coisa que deixei de explicar, pra ilustrar melhor a minha condição, é que a minha família é bastante católica. Pois é. Cresci ouvindo sermões de padres, que dão regras até pra respirar... Na igreja sentia-me menor, culpado e pecador. Sentia-me inferiorizado, por não conseguir me sentir “normal”; culpado, por ouvir padres e religiosos falando que conseguíamos tudo se confiássemos em Deus, e, se eu não conseguia, é porque eu não fazia minha parte.
Desde pequeno, eu freqüentava missas ou grupinhos infantis nas igrejas. Participei de quase tudo lá dentro: desses grupos infantis, das peças de teatro e de toda a parte burocrática, que noivos agnósticos se submetem quando a mãe da noiva quer que eles se casem na igreja católica.
A sociedade era responsável por grande parte do meu desconforto, mas essa responsabilidade passa longe da que a igreja teve na construção da minha paranóia. Era por conta do Deus cristão, que eu me desconsiderava, me sabotava, me impedia, me podava. Seja nas brincadeiras e paixonites infantis, seja nos envolvimentos, nas experiências e na plenitude importante pra adolescência e juventude. Mas mesmo tendo toda essa repressão religiosa nas minhas costas, eu ainda buscava informações sobre a minha sexualidade. Lembro que acessava a internet à procura de sites de apoio ou coisa que o valha. Lembro-me também que até encontrei alguns, um especializado para os homossexuais jovens, mas nada que me parecia interessasse. Parecia apenas que o apoio era pra quem já se aceitava ou queria simplesmente sair do armário. Eu não. Eu ainda me culpava, me achava errado, me condenava.
Mas com os meus 15 anos, queria me permitir dar atenção às minhas vontades. Até então não tinha me relacionado com ninguém, nem se quer sabia como isso aconteceria. Pra correr atrás das minhas curiosidades usei a estratégia mais fácil: internet! Facilitava porque seria impessoal e faria com que minha timidez reduzisse bastante, era como se, sem o olho no olho, eu me sentisse menos julgado ou pelo menos tinha menos a impressão de que estava sendo.
Eu usava o Mirc, um programa de bate papo. Me lembro até que o nome da sala que eu usava era “#gaybrasilia”. Nossa! Isso também me incomodava. Encontrar pessoas parecidas comigo nesses guetos me deixava meio aborrecido. Eu, com toda a culpa cristã, terminava de conversar com uma ou outra pessoa e quando saía de lá já pensava que, além de mim, esse novo amigo também estava em maus lençóis.
Certa vez, descobri que um freqüentador do Mirc era um colega da minha sala de aula: Roberto. Assim que ele me enviou a sua foto pelo Mirc, eu fiquei geladíssimo. Ele era um rapaz bem bonito, tinha o cabelo bem preto e os olhos azuis escuros, era engraçado e bastante educado. Mas, eu, na minha auto-sabotagem, mandei a foto de outro garoto que eu tinha acabado de receber, também pelo Mirc. Pronto! Não fiquei mais a vontade de conversar com Roberto e logo saí do programa.
A sala de aula era “mapeada” e eu e ele não sentávamos próximos. O que foi ótimo pra mim, que já sou trêmulo por natureza. Quando ele falava comigo, eu respondia. Mas nunca desenvolvia o assunto.  É que eu era ainda mais  tímido que hoje. Até que algo de ruim aconteceu ao Roberto e isso me deixou ainda mais perturbado.
Era intervalo no colégio, eu já estava voltando à sala de aula, quando notei um movimento diferente. Algumas pessoas voltavam e desciam pro pátio. Pois bem, até hoje não sei exatamente ao certo como aconteceu, só sei que o Roberto estava saindo com uma garota que já tinha namorado outro rapaz da escola, o Renan. Roberto foi surpreendido no intervalo por Renan, que contou, no pátio da escola, que Roberto era gay.
Não sei quais foram os argumentos que Renan usou para afirmar isso, ouvi dizer de uns que ele teve acesso ao e-mail do Roberto e, de outros, que ele tentou paquerar-lo para testar a sexualidade dele. Mas a verdade é que expor o Roberto no meio de toda a escola assim, convenceu muitas pessoas do que foi dito e ele foi condenado pelo outros tantos estudantes preconceituosos. Era uma sexta-feira, ele não voltou do intervalo e nem mesmo pra escola.
Agora até na internet eu era mais neurótico. Não só pela religião, mas pelo que aconteceu com meu colega de classe. Eu estava desconfiado de que era fácil descobrirem que eu era um “pecador”. Então, no Mirc eu não falava meu nome verdadeiro e nem dava informações que pudessem chegar até mim. Não passava foto, nem nada disso. Até que encontrei alguém em quem, depois de umas conversas, confiei!

5 comentários:

  1. nossa cara que de mais, muito interessante suas historias, até se parece um pouco com minha realidade, muito legal, ja estou meio que "viciado" em seu blog ... heheheh

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Fico contente que esteja se identificando Gochi. A idéia do blog é justamente a troca de experiências e reconhecer o outro em nós mesmos. Fico realmente feliz que esteja gostando.
      Tem post novo, um pouco mais triste e intenso, mas tudo tem seus altos e baixos, né?!
      Hehehe

      Obrigado, mais uma vez, pelo elogio.
      Beijo

      Excluir
  2. Conheci hoje o seu blog. Achei demais e senti uma vontade imensa de te conhecer....

    ResponderExcluir
  3. O seu jeito de escrever me fascina. Quero te conhecer. Me responda. Espero.....

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Perdão Anônimo. Por hora eu também prefiro ficar no anonimato, pois aqui já tenho falado de outras pessoas e vou contar algumas outras experiências minhas que envolvem amigos, família e ex-namorados e não quero correr o risco de expôr ninguém. Acho que o ideal é permanecer, por hora, no anonimato mesmo. Mas agradeço muito o elogio ao blog. Ele é simples e nada popular, mas escrevo de coração. Obrigado mesmo pelo elogio.
      =D

      Excluir